terça-feira, 29 de março de 2011

Glasvegas - EUPHORIC /// HEARTBREAK \\\


O Glasvegas possui tantas referências de credibilidade indie que muita gente desconfia da banda: eles são da classe trabalhadora (importante isso no Reino Unido), foram "descobertos" pelo mesmo Alan McGee (dono da Creation), que achou o Oasis. No mesmo lugar: King Tuts Wah Wah Hut, pub de Glasgow. E o vocalista é um sósia do Joe Strummer. Apesar de tudo, a estreia esteve á altura: Glasvegas, de 2008, é um disco recheado de guitarras e uma entrega vocal impressionante de James Allan, combinado com o amor pelo Jesus And Mary Chain em termos de tristeza barulhenta e loser, mais uma pitada de rock neanderthal.

A banda parecia decolar para a fama, mas entre 2008 e 2010 muita coisa deu errado: James Allan sofreu pelo menos uma overdose que impediu a apresentação deles no Coachella 2009, esteve desaparecido por cinco dias (na mesma semana da cerimônia do Mercury Prize), e a baterista Caroline saiu do grupo. Para o timing pop atual, o Glasvegas já estava morto. Mas esse segundo disco pode recuperar a carreira dos escoceses (e uma sueca, a baterista que substituiu Caroline).

Produzido por Flood, produtor do U2, e gravado na California, EUPHORIC /// HEARTBREAK \\\, parece ser a sequência ilógica do album anterior: ilógica porque entre a absurda badalação - inclusive nos EUA - da imprensa, fatos como uma quase-morte e a saída de um membro são potencialmente capazes de abalar a capacidade criativa, e portanto, a continuação mais coerente do trabalho anterior. Eles não tiveram escolha, a não ser arriscar. E riscos foram assumidos: basta dizer que a MÃE de James Allan está presente no disco, na abertura e na música final.

Se esse deveria ser o What's The Story (Morning Glory) do Glasvegas, um disco que expande as qualidades que foram expostas anteriormente ao mesmo tempo em que escancara o potencial comercial da banda, talvez falhe. O mercado e a crítica não parecem mais tão simpáticos a bandas como o Glasvegas. A polícia hipster agora aponta esse tipo de rock depressivo como algo desprezível. E é na insistência em calcar a imagem da miséria humana em seu som que o grupo triunfa. Sem espaço para letras calmas, Allan derrama suas frustrações de forma crua e se expõe ao ridículo algumas vezes - não muito diferente de Rivers Cuomo, do Weezer, em Pinkerton- mas não demonstra receio.

Houve algum avanço na estrutura melódica de algumas músicas: embora ainda explodam em refrões que soam como hinos de torcida de futebol - a presença de uma baterista mais hábil traz uma variedade rítmica diferente da habitual, e teclados e arranjos aproximam as canções de uma missa católica e seus cânticos. Ao contrário de bandas que exploram esse lado "rock de arena" como o Muse, Killers ou Kings Of Leon (sem citar as "veteranas" Coldplay e U2), o Glasvegas é peculiar demais para ser ordinário: Allan não canta sobre temas abrangentes e populistas; seu sotaque escocês é forte; o cara jogou futebol profissionalmente (!); ele canta sobre sobreviver até o dia seguinte. Se uma balada como Whatever Hurts You Through The Night é pop o suficiente para se tornar tema de um episódio de Glee, é também uma das mais pungentes peças sobre a depressão já colocadas em disco.

O Glasvegas pode até alcançar as paradas comerciais com esse disco, mas pertence a uma categoria de bandas que sempre estão mais próximas da escória e da miséria, como o Echo And The Bunnymen e o JAMC nos anos oitenta e o Manic Street Preachers e o finado Mansun na década seguinte. Tristeza pequena vira rock bastardo adolescente americano. É preciso uma dose de vida real para escrever grandes canções. E James Allan é um bastardo talentoso. 8,5/10

Alice Braga + Thiago Pethit = Nightwalker


Clipe novo do Thiago Pethit, extraído do disco Berlim, Texas. Dirigido por Vera Egito e Renata Chebel, vemos uma Alice Braga descalça cantando, caminhando e dançando pelas ruas de São Paulo:

domingo, 27 de março de 2011

Metronomy - The English Riviera




Tive um sonho estranho: estava numa pequena cidade costeira inglesa, numa praia de areia meio dura e muitas pedras ao redor. De clima relativamente quente para o país, fui convidado para uma festa por um cara branquelo (aliás, quem não era branquelo era cor de cenoura) e esquisito, no sentido assassino-tarado de esquisito. Não, não sei como fui parar lá e nem o nome do sujeito em questão.

Logo estávamos numa casa de classe média britânica, com toda a decoração meio cafona e florida. As pessoas eram jovens e dançavam, mas a maioria tinha uma aparência meio anos oitenta, pelo menos nos cabelos. Estranho é que todos possuíam smartphones e tal. Uma combinação e uma atmosfera bizarra. No som, rolava The Police num mashup com Orange Juice e electro.

Como a temperatura estava aumentando e as pessoas já estavam meio chapadas demais - a Lily Cole tinha vomitado em mim - todo mundo saiu pra praia de areia dura. Enquanto gente nua corria como hamsters on crack, um som grave e alto ressoava e balançava nossos órgãos internos, tipo linhas de baixo tortas vindas do céu. Junto com merda de gaivota.

No final, aparentemente havia romance no ar ou pelo menos um sentimento de gratidão. Vi uns caras do Flock Of Seagulls limpando as ruas e meninas branquinhas em uniforme escolar ouvindo dubstep. Ah, e os caras do Hot Chip estavam nas manchetes dos tablóides depois de morrerem de forma violenta. 8,5/10


Tiê - A Coruja e o Coração


Se Sweet Jardim, debut da cantora e compositora Tiê foi ganhando admiradores de forma orgânica desde 2009, seu segundo album já representa um passo adiante para a geração que nasceu batalhando espaço na cena independente. O estilo minimalista, melódico e delicado daquele disco chamou a atenção para a capacidade de Tiê para compor pequenas peças cativantes. Vamos fazer um faixa a faixa de A Coruja e o Coração: novamente produzido por Plínio Profeta, dessa vez a abrangência sonora é bem maior do que no quase lo-fi Sweet Jardim:

Na Varanda Da Liz

Conduzida pelo piano e pelos arranjos de cello que remetem a um leve aceno ao pop setentista, a canção soa ensolarada e afetuosa, com uma atmosfera mais quente. Uma abertura que serve de exemplo para a sequência do album, entregando novos elementos mas mantendo a leveza característica.

Só Sei Dançar Com Você

Arriscar uma versão de Tulipa Ruiz pode parecer uma insistência na auto-referência da tal cena paulistana, ou coisa de panelinha. Mas Tiê não deve ter tido tais preocupações: seu modus operandi não parece contemplar esse tipo de atitude. O que temos aqui talvez seja a melhor forma de dizer que há diferenças marcantes entre os trabalhos, embora a música seja boa o suficiente para merecer uma releitura: com bateria marcante de James Muller, banjos e violões e a sanfona de Marcelo Jeneci, Tiê se distancia da rotulação preguiçosa que emenda os "novos paulistas" em uma só massa.

Piscar O Olho

Para os adoradores de canções mais folk e quietas, Piscar O Olho se aproxima das músicas mais antigas: entretanto, a atmosfera é menos melancólica. Com refrão marcante, aqui vemos outro truque de Tiê: pode até soar fofinha, mas há espinhos espalhados na letra: " E eu fiquei tão grande/e mastiguei meu coração...as vezes é mais saudável chegar ao fim"

Perto E Distante

O centro gravitacional do album: talvez a melhor composição de Tiê, uma canção que queima lentamente e cresce com trompetes, o Wurlitzer de Jeneci e uma reflexão um pouco mais profunda sobre as relações.

Pra Alegrar O Meu Dia

Como uma maneira de equilibrar o ambiente mais denso de Perto e Distante, um número folk pop recheado de banjos, corinhos e letras mais bem humoradas: "Já que não te tenho por perto/eu vou tomar um sorvete/pra alegrar o meu dia."

Já É Tarde

Mais vaporosa, é uma crônica de desejo e esperança. Discreta mas efetiva, num joguete de expectativa e receio, levada por arranjos leves.

Mapa-Múndi

Música de Thiago Pethit. Mesma análise sobre a versão para a música de Tulipa Ruiz: Tiê admira a belíssima melodia e a recria de forma a demonstrar que há respiros, nuances, que ficam evidenciados na entrega e que distinguem as esferas de trabalho entre eles.

For You And For Me

Quando acompanhada por menos aparatos, Tiê mostra que é capaz de soar efetiva com uma voz delicada. Sem bateria nem percussão aqui - assim como em Sweet Jardim.

Hide And Seek

Clima country-pop para essa canção de título em Inglês e letra em Português. Ao invés de lamentar romances perdidos, a cantora afirma que "vai buscar e procurar" o objeto de seu interesse.

Você Não Vale Nada

Ao regravar o sucesso popular do Calcinha Preta, Tiê demonstra sua audaciosa porém verdadeira atração pela música: alguns dirão que há ironia, outros reclamarão da escolha e ainda haverá ponderação sobre a "forma aprimorada" de se recriar um hit do povo. Quero acreditar que, o que ela enxergou foi apenas uma boa composição. A letra derramada e o violão flamenco dão a esquentada, enquanto a voz suave da cantora faz o contraponto exato para o equilíbrio final.

Te Mereço

Usando acordes similares á Te Valorizo, do disco anterior, o album se encerra de forma mais quieta, levada ao piano e uma letra bem elaborada.

Conclusão: A Coruja e o Coração é um disco ainda melhor do que o elogiado Sweet Jardim: não apenas por ser mais completo e abrangente no acompanhamento instrumental, mas por demonstrar a capacidade de uma compositora em se posicionar de forma segura: Tiê escreveu músicas mais impressionantes para esse disco, de cores mais quentes; Sweet Jardim era intimista, frágil e cativante; mas A Coruja... expande ainda mais a criatividade das letras - agora ainda mais intuitivas, sem desmanchar a leveza que fez fãs nos ultimos anos; incluindo a possibilidade de expandir suas canções para o chamber pop, o flamenco, o rock e o folk setentistas. Discreta, ela sabe que pertencer a grupos ou explicar nuances do processo de composição são dispensáveis: seus pequenos retratos instantâneos das relaçoes humanas dizem tudo que precisamos saber. 8/10

quarta-feira, 23 de março de 2011

Micachu & The Shapes - Chopped And Screwed


Chopped And Screwed é o segundo disco do trio inglês: alguns fatos importantes para esclarecimento:

Micachu & The Shapes é liderada por Mica Levi, uma menina que inventa, adapta e usa objetos como instrumento - junto com o experimentador David Sylvester- parece chato, mas não é: Jewellery, disco de estreia da banda de 2009 é uma agitada incursão ao pop experimentalista e excêntrico;

London Sinfonietta é uma orquestra de Londres que também utiliza projetos menos ortodoxos dentro da música clássica. Um deles é esse album aqui comentado, em parceria com o Micachu & The Shapes;

O conceito do álbum é resgatar o estilo criado pelo DJ Screw, americano do Texas. Na década de 90, Screw, um adorador de xaropes para tosse á base de codeína, resolveu remixar faixas de hip-hop de uma maneira diferente: diminuindo o ritmo, quebrando o andamento e "dilacerando"pedaços da música original: é o tal Chopped And Screwed. Voce conhece o Trip-Hop e o Witch House? Então, DJ Screw tem uma parcela de culpa nessas coisas aí. Infelizmente ele morreu em 2000 em decorrência de uma não muito adequada combinação de codeína com outras drogas. A VBS/Vice Magazine produziu um documentário sobre o cara. Vale a pena dar uma procurada.

Chegamos então ao disco do Micachu em parceria com a London Sinfonietta, baseado na fórmula criada pelo DJ Screw. Mica e David criaram instrumentos especiais para essa tarefa (o disco foi gravado ao vivo com público). Eles explicaram que seus instrumentos usuais são muito percussivos e não combinariam com a base do projeto. Aos desavisados: o som aqui não possui batidas de hip-hop ou a frenética mistura de Jewellery: apenas a concepção de "dilacerar, picotar e misturar" notas melódicas. Em slow-motion.

A execução da orquestra e do trio é belamente entregue: desde o início hipnótico de State Of New York, entremeada por cordas e pequenos ruídos, com vocais fora de sincronia; Unlucky é a música que rola na cabeça do Thom Yorke e ele não tá dando conta de realizar; Everything se aproxima inicialmente dos riffs típicos do Micachu mas de alguma forma se transforma em algo ainda menos comum; Average é witch house sem eletrônica, mais assustador que rituais de magia negra; Low Dogg é ameaçadora e esquisita porque no final é quase pop.

Resultado final: não sei se fizeram jus ao DJ que amava xarope. Pela intenção, talvez tenha havido aproximação com o ar mais rachado e lento, mas o resultado é bastante interessante de qualquer forma. Não é propriamente um disco fácil de digerir, mas oferece muito para quem presta atenção. 8,5/10

Confira aí uma das faixas espalhadas pelas trocentas mixtapes do DJ Screw e tambem um mini doc sobre o disco:




Sobrevivi a uma noite de sertanejo universitario


Bom, não sei bem se era sertanejo universitário, já que não reconheço as nuances estilísticas desse tipo de música. Mas me disseram que era sertanejo. E quando cheguei ao Sesc Pompeia - esse palco tão tradicional de São Paulo para atrações de gosto classe-média highbrow - percebi uma atmosfera diferente da habitual. Dá pra listar: muitos idosos; algumas crianças; ausência da combinação Converse-skinny jeans-camisa xadrez; pouca gente balançando seu Iphone pra lá e pra cá; Isso antes mesmo de entrar na Choperia, local do show.

Já dentro do ambiente, um tiozinho veio reclamar que os bancos duros eram ruins para "aleijados" como ele (estava usando muletas). Logo puxou conversa e explicou que o que rolava nos P.A.s era "guitarrada do Amazonas", que foi a melhor contribuição para minha formação musical há tempos. Depois indagou se a menina não ia "arrebentar o tanto de cordas", admirado com a quantidade de violas no palco.

A menina é Bruna Viola, adolescente de Cuiabá e futura estrela popular. Para anunciar a entrada no palco, uma contagem regressiva entremeada por trechos de sucessos da garota no melhor estilo FM do interior. Finalizando a locução somos informados que ela é a "violeira universitária".

Admito que pensei em sair dali. Isso até a Bruna entrar tocando alguma canção tradicional da moda caipira (não, não tenho o setlist e não conheço o estilo profundamente) , num ataque incrível: evidente que tocar de forma tão intrincada e melodiosa, carregando a canção e demonstrando uma empolgação juvenil impressiona. Não acho que a Bruna ouça Caetano ou Radiohead. A imersão naquela cultura de caipirismo e violeiros e chápéus é totalmente verdadeira. Não sei se é tradição nesse tipo de apresentação, mas ela emendou algumas músicas amarrando tudo com sua impressionante técnica, me deixando preocupado com a saúde de seus dedos. E ela agradeceu a "Deus e á Nossa Senhora" por estar ali.

Depois ela abandonou o instrumento e praticou seu lado pop star só nos vocais. Parece que essa era a parte universitária da coisa toda. Reparei no público mais uma vez: muitas pessoas ostenteando chapéus e camisas de facções ou coisa do tipo, como "Sela De Ouro", "Chapeu Estrelado". Achei digno. Ao lado do palco, uma senhora dançava livremente como se algum tipo de ritual xamânico estivesse rolando (juro) com as mãos para o alto e para baixo, balançando a cabeça. O único cara de tênis lá era eu. Aliás, muitos homens e poucas mulheres. Pude observar tudo com calma porque o som vindo do palco envolvia um andamento quadrado e solos de guitarra do Journey: isso é o sertanejo universitário? Ela cantava com energia, mas a voz ficava pequena perto do aparato e das letras que falavam sobre ser corno, mas não diretamente, que universitário é "romântico".

Depois de mais alguns clássicos cantados pelos tiozinhos com mais empolgação, uns babacas chifrudos de chapéu e pertencentes a algum tipo de facção fake de caubóis do asfalto resolveu atrapalhar a minha visão do palco e desferir comentários sutis envolvendo a Bruna, "quilos de picanha, pinga e uns dez amigos no sítio". Pior parte do show: idiotas barrigudos e de peitinho estufado ostentando celulares e filmando a carne loira.

A parte mais legal foi a sequência de três músicas instrumentais, que faria parte dos músicos indie do Brasil se envergonharem de suas limitações: Bruna toca muito, e nesse universo, não é onanismo tipo rock instrumental-new-age: ela é brilhante realmente. Eu não sei a Bruna vai ser a estrela popular dos universitários ou a queridinha dos amantes da "musica pura caipira", porque ela se posicionou entre as duas vertentes. Se ela fizer essa coisa diluída e ganhar milhões, desbancando essas duplas ou cantores esganiçantes que parecem galinhas sendo estranguladas, sou a favor. Seria tipo a nossa Taylor Swift, só que muito mais cool. Uma menina ganhando num espaço de homens (?). Algo me diz que há talento demais ali, e mais cedo ou mais tarde, a guria vai apostar numa carreira mais voltada para o instrumento que carrega no nome.

Já na fila pós show, ouvi um pessoal reclamando que o Luan Santana não era tão "acessível"(era a fila para o autógrafo) e que a apresentação de Victor e Leo estava custando 110 reais. Bruna autografou, distibuiu beijinhos e deu o CD de estréia dela, além de tirar fotos. Observada de perto pela mãe-empresária-roadie-maquiadora, nem os babacas da picanha ousaram bolinar a mocinha e a trataram com respeito. Daqui a alguns dias, o público habitual estará lá de novo pra ver Dean e Britta tocando Galaxie 500. Eu curti, foi melhor do que ver o Lobão tocando no Baixo Augusta. Não que eu já tenha visto. Eu teria vergonha de admitir.

O show foi de graça e fez parte do projeto Prata Da Casa, que apresenta novos artistas no Sesc.


PS I Love You e uma típica night out canadense

Voces já sabem que por aqui adoramos o PS I Love You - mais uma banda a trazer o gostinho das guitarras anos 90 para o agora. Esse vídeo mostra como os canadenses curtem a vida no frio congelante: algo que envolve envolve música, ping pong e vômitos: vídeo de Get Over, do álbum resenhado no link acima

segunda-feira, 21 de março de 2011

Ogi - Por Que Meu Deus ? - Video


Crônicas Da Cidade Cinza será o primeiro álbum solo de Rodrigo Ogi, militante do rap nacional há mais de dez anos - com o Contra Fluxo e participações variadas. Crônicas...está Previsto para Abril, mês em que devemos ter também o novo do Criolo Doido. Possivelmente dois dos mais esperados lançamentos da música brasileira em 2011. Confira aí o clipe de Por Que Meu Deus? e comece a entender a expectativa:

domingo, 20 de março de 2011

The Strokes - Angles


Momento definidor da carreira do Strokes: nomear seu debut de Is This It?. Foi uma maneira de se precaver da badalação em torno da banda, mas ao mesmo tempo de limitar seu campo de trabalho. Afinal, era só uma coleção de músicas memoráveis e enérgicas. Mas o timing era o correto para a ressureição das guitarras, e a partir dali o indie se tornou mega; não houve fluxo de bandas menores para grandes gravadoras - que já estavam desmoronando - mas uma atenção deslocada para moleques de calças skinny. Não necessariamente uma coisa boa, mas havia um carisma de boy band para uma geração que não havia passado pela separação de tribos tão intensa quanto nas décadas passadas.

O fato de Angles ser o quarto disco dos caras, dez anos após a estréia é um atestado de que a magia se perdeu facilmente entre eles; não houve desmentidos em relação a falta de inspiração para gravar o novo disco: e os trabalhos paralelos de seus integrantes durante o período não indicavam qualquer sopro de vida inteligente. Mesmo assim, um disco novo dos Strokes gera histeria coletiva. Pelo menos, até esse aqui. Porque o material entregue por Casablancas e companhia é o retrato de uma banda implodindo e se desfazendo.

Under Cover Of Darkness foi a chave para que muita gente enxergasse uma volta ao estilo simples de outrora. Mais do mesmo, e o fato de que essa é a melhor do disco já começam a deprimir o mais ardoroso fã da banda. Em outras nove músicas, o grupo tenta demonstrar que é capaz de intercalar seu estilo efetivo com algumas aproximações e referências. Todas falham miseravelmente: Maccu Picchu é um quase reggae e abre o disco de forma brochante; Two Kinds Of Happiness é a menos fraca, um ar mais vaporoso e um refrão levado por um bom ataque instrumental; Call Me Back é uma espécie de Little Joy morrendo lentamente; Gratisfaction tenta soar pop e esperta e soa tão boa quanto o nome; o que mais impressiona é ar narcoléptico do disco. Lento, sem pegada, e com a tradicional poesia infantil de Julian: antes as letras eram complementos bem inseridos ao instrumental perfeito e as melodias vencedoras, agora são apenas palavras sem nenhum sentido.

Não é uma grande decepção: eles estabeleceram um mundinho particular capaz de movimentar a música pop comercial para um caminho menos diluído. Mas é importante relativizar a importância musical da banda: nem mesmo suas influências são amplas o suficiente para mobilizar a garotada para os arquivos digitais de artistas mais obscuros e diversos. E é isso, mesmo. Acabou o gás, o momento e capacidade de mobilizar. Sobrou só a essência: boas intenções, pouco talento. 3/10

quinta-feira, 17 de março de 2011

Top Surprise - Everything Must Go



Mineiros de Juiz de Fora, o Top Surprise teve esse EP produzido pela lenda do lo-fi brasileiro Lê Almeida. O nome do disco é o mesmo de um clássico do Manic Street Preachers, mas a vibe aqui é outra. Ostentando com orgulho a gravação tosca popularizada pelos indies dos anos 90, a banda é bastante generosa na quantidade de faixas: sete. Quando se fala em produção tosca não é uma forma de reduzir o esforço de criar e otimizar um formato, mas apenas a maneira de ressaltar o que Robert Pollard, J Mascis, Stephen Malkmus e, em maior extensão, Sonic Youth e Teenage Fanclub já empregaram. Guitarras espinhosas e melodias bem colocadas fazem o EP soar bastante convincente, até para os céticos de um revival das distorções e doçuras.

Samsara abre com as já esperadas guitarras condutoras; Saturn (The Season) acelera as coisas sem abrir mão das quebras melódicas; More Than Cool seria meu single da semana se eu escrevesse pra algum semanário britânico: perfeitamente pop e estridentemente rocker, sabor indie antes do indie virar mainstream. I Shoot The Devil é um country-punk-lo-fi divertido: uma amostra de que o Top Surprise utiliza elementos dentro de um campo musical bastante característico, mas sabe brincar com essas limitações. Com uma formação básica e uma guitarrista candidata a cool girl indie, o mundo deve ser conquistado aos poucos pelos caras (Ok, coleguinhas da Boo, voces tambem são demais: não quero causar um momento Black Francis>Kim Deal aqui).

Se o Yuck revive um tempo que a garotada que nasceu na década de 90 só imagina - pré internet, MP3, Youtube e Smartphones através de um revivalismo saudável, o Top Surprise e a cena lo-fi brasileira também merecem atenção. 7/10

Dá pra baixar o EP no Myspace deles.


Top Surprise - More Than Cool by eduardoyukio

Emicida - Rua Augusta Video

E é só isso mesmo, demorou mas o vídeo de Rua Augusta foi lançado oficialmente ontem. Como é muito bom, vamos ajudar a viralizar:

terça-feira, 15 de março de 2011

The Vaccines - What Did You Expect From The Vaccines?


Impossível não mergulhar nesse admirável novo mundo da velocidade da informação, da ansiedade e da babaquice em geral. Evidente que essa banda já foi tema de um post aqui mesmo nesse blog. E que já foi ventilada como a melhor coisa desde sempre, blablabla. A própria banda, reconhecendo a inpossibilidade de entregar o produto que esperam, nomeou seu disco de forma irônica. Então, vou fingir que nunca ouvi falar de tais rapazes londrinos e acabei de receber meu CD (sou antigo), e deslacrei.

A sensação mais clara é que a produção deixou as nuances de lado e partiu pra apelação das compressões e volumes altos nos instrumentos, principalmente as guitarras. A banda ataca as canções com a energia necessária, e as melodias, simples, bebem na fonte de Ramones, bandas vocais dos anos sessenta (não muito diferente do som dos Raveonettes) e algum cheiro de punk Clash. E obviamente - desde o fato de nomear o disco de forma a revelar suas limitações - os Strokes. A diferença é que o Vaccines não emula o som do quarteto novaiorquino; realmente, alguem precisa avisar aos críticos cuja idade mental é de quinze anos (ou seriam realmente moleques escrevendo? hummm...) que músicas rápidas, roqueiras e grudentas não foram inventadas no Is This It?.

São onze músicas, incluindo as já conhecidas Wreckin'Bar e Post Break-Up Sex. Não dá pra imaginar moleques ouvindo isso e partindo loucamente para uma vida de drogas e rock e destruição. Mas na repetitiva porém verdadeira afirmação de que o pop vai se reciclando, talvez adicionando um folego que vai se perdendo, o album é muito válido. Rock delicioso, sem arestas, rápido e rasteiro. Como já falado, nuances não são a tônica aqui, então há uma certa linearidade que só evita a repetição pelo poder dos refrões e inspiração dos garotos. Dito isso, não ouvi nada tão efetivo na área indie-rock grudento em anos. Me lembra o caso da esquecida banda de Chicago Smoking Popes, que tocava na mesma base coberta pelo Vaccines, exceto pelos vocais de crooner. Eles não mudaram o mundo, mas tiveram uns dois bons discos antes da decadência.

All In White é um indício de que o Vaccines pode trabalhar um pouco fora de seu estilo rapidez/ganchos e incluir climas interessantes na fórmula. Mas aguardemos pelo próximo disco, que fatalmente será destruído pelos pós adolescentes críticos do mundão. Foda-se, ouça esse disco, os caras são bons. 8/10

segunda-feira, 14 de março de 2011

Youth Pictures Of Florence Henderson - Youth Pictures Of Florence Henderson


Esse é o segundo disco da banda norueguesa que pratica um post rock de primeira. Ok, Noruega, pós rock, nome gigantesco,...se eu acrescentar a informação de que eles ouviram muito emo antigo voce desistirá de ler até o fim? Não desista.Vamos esclarecer as coisas: O termo emo É antigo e se iniciou nos anos oitenta, com bandas de hardcore americanas que se dissociaram do viés político e se entregaram ao conteúdo emocional das letras. Nos anos noventa, bandas como o Sunny Day Real Estate reestabeleceram o termo ao incorporar elementos mais intrincados em sua música. E o SDRE é uma das principais referências desse pessoal. Quanto ao post rock, eles apostam na frieza dos tons azuis do Sigur Ros, embora não insistam nas explosões sônicas dos islandeses.

Entretanto, o YPFH não pretende apenas ser uma banda que presta tributo ou que se mantem dentro de suas referências: há força suficiente nas oito faixas do album, que são construídas sobre a base da fórmula melodia+ crescendos+ jogos instrumentais. A busca da beleza e da diversidade, e a criação de ambiências é bem sucedida pela maior parte do tempo. Há destaques, embora o disco sofra um pouco mais na segunda metade pela insistência no andamento mais cadenciado. Nada que comprometa a magia de Let's Rent Bikes From 1942, que possui arranjos leves e uma delicada entrega.

Com a mesma elegância de um Effterklang, porém mais cru, To Sir Or To Follow, So I Follow tambem merece audição mais apurada. Banda segura, talentosa e que merece maior destaque entre os fãs de música "emocional", no sentido mais puro da palavra. Não estou imaginando adolescentes bem nutridos chorando, mas pessoas que amarram música pop com a vida, indissociavelmente. 7,5/10

É possível fazer o download do album no esquema "pague quanto quiser" aqui.

Youth Pictures of Florence Henderson - Let's rent bikes from 1942 by eduardoyukio

James Blake - Joni Mitchell Cover "A Case Of You"

Linda versão do James Blake para a música de Joni Mitchell. Uma das formidáveis canções de Blue, album de 1971 da compositora canadense. Fique com a versão do inglês e a original:


JAMES BLAKE - A Case Of You (Joni Mitchell Cover) by wright82



domingo, 13 de março de 2011

Jair Naves - Araguari EP


Quem teve a chance de conhecer o trabalho da banda paulistana Ludovic, sempre se lembrará das letras desesperadas e a entrega catártica do vocalista Jair Naves. O grupo parecia sempre no limite, prestes a perder o controle, o que era ótimo. Pena que acabou. Mas agora Jair está de volta, com um EP solo.

Os sentimentos de nostalgia e arrependimento são claros desde o título do disco, que se refere à cidade de nascimento do compositor. Refletindo sobre a inocência perdida, os valores da vida no interior em contraste com a cidade grande, Jair agora soa bem mais melódico e acessível. Meus Amores Inconfessos é quase uma mea culpa por ter deixado pra trás uma possível vida mais tranquila e feliz em Araguari; as letras continuam marcantes : "Fato é que eu não sou mais quem era antes/voltei envelhecido e hesitante/hoje eu que cuido dos meus pais/e as crianças da nossa rua já não somos mais". Raro no rock nacional versos tão coerentes e de lirismo simples e efetivo.

Meus Dias De Vandalo não alivia o conflito psicológico de Jair (presente na banda Ludovic). Uma maneira de mostrar que o lado escuro e aflitivo ainda estão presentes, ele canta sobre um amor errático: "...Na madrugada eterna e ardente/que te deixou toda em carne viva". De melodia linda e arroubos romanticos e desiludidos, a canção é uma das melhores ouvidas por aqui nos últimos tempos. Muito poeta/compositor folk mataria por essa habilidade e talento.

A terceira música do EP é De Branquidão Hospitalar: de pegada pós-punk, Jair faz a relação entre as doenças da alma e do coração conflitarem com os demônios de uma ansiedade febril. Fechando o disco, temos Silenciosa; delicada e densa, a melancolia de uma reflexão abraça o ouvinte com seus lamentos e a voz firme de Jair. Um trabalho que escancara o talento de um compositor que só consegue cantar sobre o que é humano e real, mesmo que doloroso. 8/10



sábado, 12 de março de 2011

IT Crowd e suas conexões musicais


IT Crowd é uma série britânica de humor que já está na quarta temporada e é vencedora do BAFTA Awards. Uma quinta temporada já está garantida para esse ano. Baseado no núcleo de TI de uma empresa londrina formado por dois geeks (o irlandês Roy, o gênio Moss) e a atrapalhada chefe (Jen), uma "gerente de relacionamento" completamente ignorante em relação á tecnologia, a série ganhou admiradores pelo mundo pelas referências aos mundos corporativo, geek e pop. Nessa ultima área, a música ganha destaque.

O ator Richard Ayoade, que interpreta o inacreditável Moss, é também um diretor de videoclipes de mão cheia, trabalhando em videos do Arctic Monkeys, Super Furry Animals, Yeah Yeah Yeahs, entre outros.

Na sala de trabalho do pessoal do TI, há um poster do Guided By Voices, que é uma das bandas preferidas do criador do seriado, Graham Lineham.

O ator Matt Berry, que interpreta o chefão das indústrias Reynholm a partir da terceira temporada é compositor e cantor: seu álbum Witchazel ganhou edição nova agora em 2011 e é uma coleção de folk, psicodelia prog de fazer inveja a muito barbudo deprimido da cena. Berry injeta humor sem soar demasiadamente ridículo, e as cançoes são muito bem construídas. E sim, Matt Berry canta bem.

Outra personagem interessante apareceu nas duas primeiras temporadas: interpretado por Noel Fielding, Richmond ficou confinado nos porões do departamento de TI e se tornou gótico depois de conhecer o Craddle Of Filthy.

Por fim, a música tema do seriado foi composta por Neil Hannon, do Divine Comedy.

O elenco atual é formado por Chis O'Dowd (Roy), Richard Ayoade (Moss), Katherine Parkinson (Jen) e Matt Berry (Douglas)

Deixo voces com exemplos do brilhantismo da série e desse pessoal;

Meu clipe predileto dirigido por Richard é o do Super Furry Animals: Run Away, que também conta com a atuação de Matt Berry;



A banda preferida do criador da série é a incrível Guided By Voices, aqui com o clássico I Am A Scientist



O Myspace do Matt Berry é esse aqui: http://www.myspace.com/mattberrysmusic

Abaixo, trechos do começo do seriado, pra quem não conhece (sem legendas, infelizmente)

British Sea Power - Who's In Control Video NSFW

Valhalla Dancehall é o melhor disco do British Sea Power. A música que abre o disco pergunta "quem está no controle" e é um belo exemplo da pegada do album. Sem politizar nenhuma canção, o vídeo segue a excentricidade das letras e mostra protestos violentos, como os de Londres, mas termina com todo mundo pelado e dançando:

The View - Bread And Circuses


Nossa, o The View chegou ao terceiro disco, quem diria? Nascido naquele longínquo periodo, o meio da década passada, entre o declínio do Libertines e o desespero de críticos ingleses, os escoceses chegaram a ser colocados como salvadores do rock n. 661; só que os Arctic Monkeys varreram todas as bandas menores (apesar de Hats Off To The Buskers, o disco de estreia ter alcançado o primeiro lugar na parada britânica). Só sobrou o restinho da cocaína e a bebedeira crônica para o The View, que ainda lançou o largamente ignorado Which Bitch?, em 2009.

O fato é que nenhum dos dois discos merecia muita atenção: bebendo na fonte dos Libertines, a banda limitava seu estoque de truques com canções toscas e mal tocadas. Francamente, eu esperava algo entre o horroroso e o triste para esse Bread And Choruses. Sabendo que o Vaccines promete fazer o revival das bandinhas inglesas da década de 00, ouvir uma das representantes do período cair de cara no chão seria um pouco deprimente. Exceto que os caras trocaram de produtor (saiu o porra louca Owen Morris - de Definitely, Maybe, do Oasis) e chegou Youth. Acredito que tenha sido um encontro do tipo: "Voces querem ser mais um grupinho indie de merda ou ganhar as paradas de verdade, com músicas boas e tudo o mais?"

A resposta foi imediata: Kyle Falconer aprendeu a cantar e o que não falta é inspiração para refroes grudentos. A entrega é enérgica como sempre, mas mais bem executada e variada. Ninguém se engane: aqui o negócio não é uma música nova e audaciosa, mas uma música pré-histórica e familiar, incapaz de mudar o cenário e apontar novos caminhos. É como o Oasis tocando mais rápido, que é obviamente algo incrível de se imaginar. Remonta ao mais básico da tradição pop britânica: juntar elementos e referências, criar e referenciar, costurar tudo e entregar quente; aqui os escoceses soam não como garotos impressionados com Pete Doherty, mas herdeiros de Noel Gallagher, Paul Weller, Pete Townshend, Joe Strummer. Bebendo em fontes mais profundas e compreendendo suas próprias limitações, The View agora sim pode ser apresentado de forma mais elogiosa.

Grace é uma abertura bombástica, um crescendo que se apoia em riffs corretos e explodem em refrão que atinge o céu; Underneath The Lights não soaria fora de contexto em Parklife, do Blur;Girl é uma balada sessentista recheada de Uuuu- Uuuus; Life é um possível hit de proporções melosas - de um jeito simpático; Friend é new wave/disco; Sunday possui andamento metronômico; Alguns vão achar que a banda buscou atirar para todos os lados em uma desesperada tentativa de vender discos; eu diria que há pequenos passos fora da área de comforto, mas ainda é banda de moleques que canta e toca sobre o que é relevante no pequeno mundo deles: ao mesmo tempo, aqui Kyle e seus colegas empregam não apenas maior habilidade, mas resistem á maquina de destruição de bandas; não perdem a emoção, o suor. São sim músicas sobre garotas, garotas e garotas, bebidas e noites insones mas há uma declaração de intenções aqui: ser verdadeiro. Bread And Choruses te faz querer sair com os amigos pra beber, sorrir pra pessoas - essa atividade tão árdua - ou apenas imaginar um dia seguinte melhor enquanto tenta dormir. Não é isso que importa? 8,5/10

quinta-feira, 10 de março de 2011

Anna Calvi - Anna Calvi



A inglesa aclamada no início do ano como promessa pela imprensa musical de seu país não decepciona em seu primeiro disco. No imenso universo pop de cantoras britânicas novas, há espaço pra quase tudo: pop-rock, indie rock, electro, soul, folk...Anna Calvi soa diferente. Assim como a estreia de Lonelady no ano passado, Calvi desbrava um cenário menos óbvio: referências dark-goth, blues rock, guitarras de toque espanhol: alicerçado por uma voz extremamente marcante (Florence, chore) e essa forma não menos impressionante de tocar sua guitarra, Anna possui um repertório forte de dez canções. Nenhuma delas passa sem te causar arrepios. A produção ajuda, deixando os ecos, reverberações e a voz serpenteante da cantora dominarem.

De personalidade forte, o album soa sim bastante dramático e sombrio. Mas não há como não ser envolvido pelas ambientações de Calvi. Comparações com a PJ Harvey jovem já ocorreram, mas a sintonia parece ser diferente: a fúria e a crueza de PJ contrastam com a entrega romântica e a forma mais rebuscada de tocar guitarra de Anna. Dois vídeos abaixo, capturados ao vivo, são exemplos claros do que esperar de Anna: o primeiro é uma versão para Jezebel, famosa na voz de Edith Piaf nos anos cinquenta (não está no disco) e a outra é a rendição de sua própria Desire.

De tom teatral, a música que é entregue aqui é uma trilha para turbulências emocionais, paixão e sangue, de cores fortes; entretanto, a beleza é tanta que equilibra temas perturbadores e transforma em pequenas obras primas dark. Um debut encantador. 9/10


terça-feira, 8 de março de 2011

O caminho lento da aceitação: Apanhador Só


Ok, passei o ano de 2010 investindo em imersões musicais mais profundas desde que saí do colégio há mais de dez anos atrás. Mesmo assim, é evidente que não pude acompanhar toda a movimentação de bandas independentes ou mesmo a mais evidente das demonstrações do mainstream pop, os ultimos singles da Lady Gaga. A diferença é que essas coisas radiofônicas chegam até nós de uma forma ou de outra. Outro problema, além da falta de tempo, é que supomos gostar mais desse ou daquele perfil: por mais interessado em ouvir coisas novas, há sempre uma barreira mental: porque diabos eu ouviria uma banda gaúcha que parecia sensível demais quando me faltava ouvir o free jazz do Dave Burrel?

Mas, chegou o dia em que, entre recomendações entusiasmadas e gente que me dizia que a audição seria cruel, cumpri uma das minhas obrigações quando iniciei o blog: ouvir de tudo, escrever sobre o que me entusiasmou, e eventualmente sobre o que me revoltou de tão ruim. Sempre baseado em análises simples e pretensamente pontuais. Com um bocadinho de emoção e sensações para compartilhar.

Ouvi o disco de estreia dos caras no final de 2010. Logo me chamou a atenção as letras que não pareciam ser tão engraçadinhas como haviam comentado: se pareciam mais como crônicas bem destiladas e ótima escolha de palavras. O som poderia dever alguma coisa á estética da década passada com as guitarras carregando e duelando nas melodias, mas me passou longe a idéia de um som Los Hermanos, uma banda que nunca me agradou: faltava punch e equilíbrio melódico. E o Apanhador Só tem essa pegada rocker, mas soa assim meio despretensiosa. Diversas audições depois, me rendi ao bom trabalho dos gaúchos. Sólido disco, recheado de bons sons e riffs e quebras interessantes. Fica a dica: ouça de coração aberto. E voces que não curtiram, tá aqui minha nota: 7/10

segunda-feira, 7 de março de 2011

Solis - Camucais


O caminho percorrido pelos músicos até encontrarem uma maneira de expressar seus atributos pode ser longo, mas é recompensador se resulta em trabalhos como Camucais, da cantora e compositora pernambucana Solis. Residente de Olinda, já cantou fora do Brasil e experimentou com ritmos diferentes como intérprete. Entretanto, seu disco de estreia é um caldeirão de ritmos afro mesclados com uma abordagem mais pop, brasileira e contemporânea.

Conhecedora de ritmos de Cabo Verde, Solis incorporou a fusão africana-européia daquele país de forma orgânica em sua refinada formação musical, que sugere audições de jazz, ritmos nordestinos, samba e rock. Há a participação do músico cabo-verdianos Tchida na exemplar Mariana: um lembrete de que a batida afro, repleta de alegria rítmica, é quase sempre acompanhada de uma temática de dor e resistência. A voz forte de Solis nos conduz a melodias doces, percussão eficaz e arranjos leves. Nada aqui sofre de exageros, e a produção de Juliano Holanda e Fumato mantem a temperatura adequada: há quebras no andamento com baladas como Balafon, Braseiro e Malu, que mostram a diversidade melódica do disco assim como a segurança de Solis como cantora. Solano Em Angola é recheada de riffs contagiantes e O Tempo é extremamente bem acabada. Ao longo do disco somos expostos a linhas de baixo jazzy, batuques, intervenções pop e emoção. Parece muito, mas é entregue de forma bonita.

Camucais é um disco que convence em todos os aspectos, e Solis demonstra que pode caminhar entre o romantismo e a sensualidade, entre a admiração pelas batidas afro e a brasilidade, e, principalmente, faz isso de forma intoxicante. 8/10

Solis - O tempo by eduardoyukio

sexta-feira, 4 de março de 2011

Burro Morto - Baptista Virou Máquina


Existe um conceito que conduz esse disco dos paraibanos, sobre o tal Baptista do título, e tem a ver com seus trabalhos repetitivos e depois algumas mudanças em sua vida; as faixas partem dessa premissa, colocando o Baptista repetitivo e duro caminhando para um mais solto e fora da rotina. Há um filme que acompanha o disco - e não o contrário - mas esse eu não tive a oportunidade de ver.

A coisa com bandas instrumentais é que elas suprimem um elemento tão decifrável e modelador como os vocais, então voce espera que eles sejam realmente bons - não no sentido masturbatório-técnico, mas na inventividade. E esse disco vai te convencendo a cada faixa: não há tentativas forçadas de soar moderninho, então o que rola mesmo é o groove, o ritmo e a repetição (no início principalmente). A mudança de humor é sentida na aspereza de alguns momentos, balanceados de forma segura. Esses caras não começaram ontem, há modulações e matizes de quem já experimentou com timbres e tocam de forma afiada.

Não vejo porque uma banda como o Burro Morto não possa ser tão adorada quanto os produtores de experimentações eletrônicas, até porque embora soem orgânicos, há eletrônica espalhada na concepção do disco. Não é um caso de informação demais e tiros pra todo lado: psicodelia exige uma forte dose de concentração - e talvez outros elementos não musicais - ao contrário do que normalmente se pensa.

Da metade do disco pra frente a coisa começa a ficar cada vez mais interessante, os acordes se tornando menos previsíveis e o climão esquisito predominando. Não estou citando faixas em particular, porque acredito que esse seja um album pra ser ouvido de uma só talagada, imaginando o Baptista dando uma piradinha básica. Mais do que instigante, o melhor lançamento naconal do ano por enquanto. 7,5/10

Burro Morto - Foda do Futuro by eduardoyukio

quarta-feira, 2 de março de 2011

Elbow - Build A Rocket Boys!


Sinceramente, há momentos em que, por maior que seja o seu amor pela música pop, escrever sobre ela se torna difícil. Porque nem sempre temos como superar a mais elementar das dificuldades: buscar inspiração. Pra escrever um texto puramente descritivo, basta não ser preguiçoso. Mas para transportar a experiência da audição de um album ou canção para um punhado de palavras que façam sentido, aí precisamos de inspiração. Pode ser simplesmente a repulsa por mais um lançamento da velha MPB, rodeada de amizades e mediocridades e adulação, ou uma descoberta preciosa, esse sentimento é que te leva a escrever. Quando voce trabalha com uma pauta de dez discos para escutar em poucos dias, é bem provável que opte pelo caminho seguro de um texto mais neutro e simples. E sem inspiração, obviamente.

Para além disso, há tambem a situação de estar situado no mundo: a música pode ser a válvula de escape mais bem utilizada para que a alienação nos faça felizes, mas fica difícil não ser abalado quando a brutalidade, a ignorância e a indiferença fazem parte do seu dia a dia. Gente sendo tratada como lixo e tragédias rotineiras começam a ter um efeito tóxico, aniquilando qualquer inspiração.

Mas eu cheguei até aqui, muito graças a Build A Rocket Boys!, quinto disco dos ingleses do Elbow. Sim, noites insones e revolta coletiva contra atropeladores, racistas, panelinhas corporativas, indies esnobes e lixos humanos á parte, esse disco me colocou em condições de escrever. E isso pode significar mais do que a própria resenha. Talvez seja apropriado descrever que a banda sempre foi muito apreciada por aqui durante toda a década passada. Seus quatro discos anteriores são todos no mínimo bons, e combato aqui as principais críticas em relação ao Elbow: som pomposo, devagar, piegas e com integrantes feios. Sim, já li tudo isso sobre eles.

Quanto ao som, o Elbow faz sim um rock mais lento, com boa atenção aos arranjos, andamentos, e construção poética. Daí a ser pretensioso e chato é uma longa distância. O Libertines era tosco e muito mais pretensioso. Guy Garvey não é o seu indie boy típico porque é mais velho, desajeitado, gordo e brutalmente sincero. Tudo que o Julian Casablancas estabeleceu como cool na década de 00, Guy Garvey é o oposto disso. Ele nem pode dizer que é de Nova Iorque. Nem de Manchester, porque eles são de uma região próxima ainda mais fim do mundo.

Build A Rocket... não difere muito dos discos anteriores. Aparenta ser o trabalho de um grupo confortável em seu ambiente, sabendo de seus limites e trunfos, aprofundando lentamente a experiência sonica. Entre as construções melódicas delicadas, músicas de pegada mais rítmica (eles são ótimos músicos, versáteis) e a poesia de Garvey. Mestre em montar imagens de emoções vividas sem soar óbvio ou demasiadamente auto depreciativo, o vocalista sabe ser até mesmo engraçado em alguns momentos. Duas músicas no disco mostram essa volatilidade: Dear Friends é um canção forte em forma de delicadeza e High Ideals balança com a linha de baixo marcante.

Garvey, apesar de o Elbow ser relativamente bem sucedido nas vendas no Reino Unido, não dá a mínima pra última sensação. Não escreve sobre o que é conveniente, nem para as rádios. Conhecido por não ser um sujeito radiante, se diz mais feliz hoje. Mas descobriu que escrever sobre a felicidade é muito mais chato. Então ele olhou para outros cantos para compor o disco. Lippy Kids é uma forma de combater a imagem que a parcela mais conservadora da sociedade inglesa faz dos jovens: são apenas delinquentes idiotas para eles, são "freshly painted angels walking on walls" para Guy Garvey. Neat Little Rows, o primeiro single, possui um típico andamento bem marcado e refrão mais bombástico. Talvez seja esse o album mais balanceado da carreira do Elbow, no sentido de que as canções se sucedem em ordem adequada e essa inclinação mais prog-rock não cansa o ouvinte.

The Birds, insinuante e bela, é possivelmente a composição que o Radiohead estaria fazendo hoje se não pertencessem a um outro mundo: grandiosa, mas não pernóstica. Então basta dizer que, bem, fui salvo pela milionésima vez pela música. E o que um cara como o Guy Garvey tem a oferecer? Somente sua voz, suas letras e uma banda bacana. É isso contra toda a merda - de música e de babaquice - que a gente vê por aí. Funciona pra mim. Construí um foguete, mesmo. 9/10

terça-feira, 1 de março de 2011

The Low Anthem - Smart Flesh


Pouca gente presta atenção, mas esse já é o terceiro disco do quarteto americano de Providence. Depois da atenção tardia dada ao segundo album Oh My God, Charlie Darwin, Smart Flesh é mais uma pequena obra prima desses caras. Alguém pode dizer que bandas com raízes profundas no folk e no country são como pragas, já foram chamadas de alt.country, americana e outros termos. Quase sempre fazendo a alegria de jovens que nunca ouviram nenhum disco de Pete Seeger ou Woody Guthrie, e nem fazem idéia do que representa realmente o folclore popular ancestral da Asia, ou mesmo da Europa. Inevitavelmente, essas bandas (e principalmente os trovadores torturados) vão parar em trilhas de filmes medíocres ou séries de tv, ilustrando cenas "melancólicas".

O Low Anthem não é nada disso. Eles não tocam seu violãozinho e reciclam bobagens. São músicos de verdade, tocam diversos instrumentos, trabalham harmonias vocais complexas e constroem paisagens belíssimas, sem apelações. O conhecimento musical deles vai além do trivial: quando voce acha que o disco caminha pra um minimalismo, entra um furacão; quando o vocalista abusa do falsete em uma canção, na próxima parece um Tom Waits do inferno.

Smart Flesh é menos delirante do que ...Charlie Darwin nesse sentido. É mais tranquilo e delicado, mas não menos elaborado. E é exatamente nessa aparente linearidade que se escondem os mais belos pedaços de música: Cada instrumento inserido parece dar cor a um determinado verso, ou mesmo quando há apenas a instrumentação e o silêncio, esse jogo é feito de forma tão magistral que praticamente dizima a "nata" da produção, aham, indie do gênero. Exemplo: Wire, sem vocais e tão efetiva.

Gravado em uma fábrica abandonada, o ambiente hermético e não usual pode ter trazido algum efeito de rádio AM para alguns sons, enquanto Ben Knox Miller canta sobre "levar suas cinzas". Não exatamente seu poeta abandonado comum. No final, Smart Flesh é um disco mais lento que seu antecessor, que ganha mais relevância com algumas audições repetidas, e se isso pode ser colocado como fraqueza, então que seja o ponto crítico do disco. Mas também vai demorar muito mais pra voce enjoar dessa coleção de músicas, que de velhas possuem apenas o formato: foram escritas por pessoas que vagam nesse mundo brutal, digital e rápido. E que transcrevem essas emoções por meio de acordes atemporais. 9/10