terça-feira, 12 de abril de 2011

O rap é pop na revista semanal

Matéria publicada na revista Época com o singelo título "O rap virou pop" gerou mal estar em quem realmente está envolvido com o gênero. Inclusive nos que foram entrevistados e/ou citados pela reportagem. Basicamente, a matéria tenta estabelecer uma suposta diferença de atitude dos "novos" rappers: agora eles possuem discurso e som mais acessíveis ao público médio da revista, portanto é uma aviso para que não tenham medo do rap. Aquele estilo de gente mal cheirosa e da periferia, de cara feia e terrorista ficou pra trás. A classe média pode consumir sem preconceito, afinal eles "falam de amor e usam roupas de grife".

Os repórteres tiveram o cuidado de ouvir quase todos os caras: Emicida, Lurdez da Luz, Criolo...mas a intenção já estava configurada. A idéia era mostrar que a revista é "mente aberta", mas principalmente que o gênero rap nacional agora é pop. Tipo Black Eyed Peas. O mais verdadeiro está nas declarações recortadas e inseridas: Rincón Sapiência explica que a ascensão dos pobres permitiu uma mudança de visão dentro das periferias; Criolo diz que a mistura de ritmos sempre existiu; as declarações contradizem o espírito empregado pelos jornalistas, de que houve uma brusca ruptura com o rap dos anos 90. Bem, estamos falando de vinte anos de diferença...

Não houve nenhuma preocupação em compreender a linha evolutiva do estilo: épocas diferentes, realidades diferentes, mídias diferentes, necessidades diferentes. Até mesmo foi empregado uma espécie de infográfico, em que Mano Brown, Tháide se opõem á Emicida, Flora Matos. Num esforço brutal de reportagem, descobriram que nos anos 90 usavam "batidas eletrônicas quase sempre criadas por DJs". Como todos sabem os DJs estão todos mortos agora. Em contraponto, os novos usam "outros ritmos (?) e instrumentos ao vivo". Ahh, muito mais artístico.

Não entender do assunto não é demérito, a não ser que voce seja pago para escrever uma matéria que humildemente sugere "explicar" ao público como o rap nacional se formou e mudou para o pop. Ninguém pensou em relativizar essas mudanças com processos inerentes á qualquer tipo de música popular. Afinal, estamos falando de décadas de discos produzidos. Como era tocar rap nos anos 80? E nos anos 90? Qual a vida pregressa desses "novos"?

Aqui quem escreve é capaz de assumir que não conhece profundamente o assunto. Mas percebe que a capacidade de criação, as novas tecnologias, as mudanças geracionais desaguam em resultados mais diversos, em que a falta de distanciamento histórico não permite dizer com clareza que alguém é melhor ou pior. Que o gênero se renova por necessidade, sem anular os méritos de quem desbravou os mesmos territórios. E que o reducionismo só serve pra desinformar. A nova geração caminhou até aqui, e fez calos nos pés. Andaram, como a Lurdez diz aí:

5 comentários:

  1. PARABENS. Rap merecia uma resposta!

    ResponderExcluir
  2. Mas essa música desse clipe ae é muito ruim.

    Quero a década de 90 de volta se for assim.

    Abraço

    ResponderExcluir
  3. Rafael, eu já fazia rap nos anos 90. Se vc num sabe deve ser porque num curtia ou ainda era criança. Achar ruim é direito seu. Parabéns pelo texto, infelizmente rolou essa manchete sensacionalista, não é primeira vez, querem dizer que o é feito hoje em dia é oposto ao que era feito o que é uma mentira. Todos nós só fazemos rap pelo amor que sentimos ouvindo esse rap "politico e marrento" e sei lá o que mais... O rap ainda é favela sim num importa se estiver na t.v ou ganhando dinheiro, alias nada mais justo. Foi bem ignorante essa matéria.

    ResponderExcluir
  4. "Que o gênero se renova por necessidade, sem anular os méritos de quem desbravou os mesmos territórios." - É exatamente isso que os jornalistas não enxergaram, ou na verdade não quiseram enxergar, e assim, não tiveram a dignidade de informar corretamente o que é,o que foi e o que sempre será o rap nacional.

    Ótimo texto!

    ResponderExcluir
  5. Pois é...não tem essa de Mano Brown x Emicida / Thaíde x Sapiência. É tudo uma continuidade conquistada pelo rap de ontem e de hoje.

    ResponderExcluir