quinta-feira, 3 de maio de 2012

Curumin - Arrocha


Curumin é um músico calejado: como baterista/percussionista já trabalhou com artistas diferentes como Céu e Arnaldo Antunes e esteve no palco com muitos outros como Criolo e Vanessa da Mata. Também é um compositor curioso e despojado, o que conta muitos pontos a seu favor: desde 2003, com seu primeiro álbum, "Achados e Perdidos", passando pelo elogiado "Japan Pop Show" (2008) até chegarmos a esse recém-lançado "Arrocha", Luciano Nakata  manteve seu próprio ritmo. Sem pressa para colocar novas canções em registro definitivo, Curumin cultivou um saudável frescor em cada um dos seus discos, tornando-os relevantes mesmo sendo lançados em períodos distantes e espaçados. "Arrocha" é o mais enxuto e direto trabalho do paulistano, um pop ritmado e equilibrado nas influências típicas como música jamaicana, hip-hop, rock e brasileirismos setentistas.

Gravado no esquema caseiro, o disco utiliza muitos elementos eletrônicos: para um baterista de formação, o risco de formar uma massa de batidas insistentes desequilibrando as harmonias é maior. Sabendo disso, Curumin não abriu mão de utilizar toda sorte de variações, sendo inventivo nos momentos em que as músicas pediam mais harmonia e quietude. Sobrou para as vinhetas o papel mais simplista, de conexão  despida em relação às canções, em geral de sólida formação melódica. "Afoxoque" traz eletricidade em uma pegada imediata de acento dancehall: um ponto de partida que alimenta a curiosidade do ouvinte, presenteado com uma virada de primeira para a música seguinte, "Selvage"; é o ponto em que a percussão orgânica dá passagem no mix para uma introdução eletrônica, reveladora da habilidade do autor. O dub "Treme Terra" traz mais uma boa novidade: Curumin parece cantar com mais desenvoltura, moldando versos e fortalecendo uma percepção de confiança. Até aqui temos um disco permeado de batidas bem marcadas, melodias claras e uma ligação que não permite silêncios entre uma música e outra. Uma saraivada de batuques que, mesmo empolgantes, poderiam deixar um certo cansaço se persistissem. A sequência com a suave composição original de Russo Passapusso, "Passarinho", é o momento de despressurização: a bela canção é levada com organicidade e é repleta de soluços, caminhos de efeito instantâneo, algo que Roberto Carlos assinaria circa fim dos sessenta, início dos setenta; mesmo assim, sem nenhum ranço de referencial exacerbado, possui um encantamento urgente, um clamor de novos ares românticos. 

"Paris Vila Matide", além das citações relativas à metrópole paulista, é uma balada acústica que faz uma reflexão humanista, de relações entre distâncias, pensamentos e a necessidade de aproximação comunicativa. Contrapontos pungentes em relação ao início frenético do disco, "Passarinho" e "Paris Vila Matilde" não surgem como estranhezas, mas extensões naturais do exercício pop - ainda que de forte apelo instrumental - das composições de abertura. "Vestido de Prata", com participação da Céu, é um convite ao baile: como uma noite junina no interior nordestino colidindo com ares jamaicanos, é um hit pronto que aquece a ambiência de "Arrocha". Uma temperatura que não mais cairá, seguida pelo reggae suado de "Doce",  o hip-hop de "Blim-Blim" e "Sapo Cururu" e os versos falados de "Acorda". Antes da despedida com "Bambora!", uma inserção dispensável, há mais uma canção ao estilo cantor-compositor: Curumin canta com inegável desenvoltura "Pra Nunca Mais", bonita em sua cadência de uma quase valsa.

"Arrocha" é um disco extremamente enxuto, de canções curtas, coesas, porém de recheio delineado. Equilibrando a natural vocação para o ritmo de beats e percussão marcada, há espaço constante para a fluência melódica e consciência voltada para a absorção natural das influências. Ao cantar "Vou andando só por andar/sonhando sem acordar...(sou) uma pluma/ no macio do ar/arrepio do vento a me levar", o compositor acaba, de forma consciente ou não, resumindo suas intenções e abordagem artística: inspiração e intuição caminhando junto com a conveniência do momento, que se faz correto por circunstância. "Arrocha" é o fruto mais bem-acabado de sua carreira até agora. 8/10  

Nenhum comentário:

Postar um comentário